26 de março de 2007

Problemas de comunicação



Que a dinâmica da construção europeia se encontra num impasse, não é novidade para ninguém.

A rejeição, em referendo, do projecto de Constituição Europeia pela maioria dos cidadãos franceses e holandeses – dois países-âncora da ideia de Europa unida – deveria ter servido de sintomático aviso às instâncias comunitárias, em geral, e à Comissão Europeia (CE), em particular, de que a distância entre o indivíduo e a máquina política não só não foi encurtada como voltou a aumentar.

Apesar da boa imagem que as instituições europeias continuam a granjear junto dos cidadãos – especialmente se for levado em conta o notório desencanto com os políticos nacionais (os acontecimentos de Budapeste devem ser encarados seriamente como um case-study de análise urgente) –, a dimensão de distante tecnocracia do Parlamento e da Comissão continua a ser um entrave à efectiva participação dos cidadãos no processo de edificação de uma Europa unida. Isto, porque – mesmo por especificidades históricas e culturais – este processo nunca poderá ser semelhante ao dos Estados Unidos da América ou da União Indiana – as realidades da China e da Federação Russa são diferentes, derivadas de uma herança imperial.


Isto conduz-nos a um dos factores que, provavelmente,
mais tem dificultado a difusão de ideias e decisões junto da comunidade cívica dos vários Estados-membros da União Europeia (UE): os problemas de comunicação. Ao longo dos anos, várias têm sido as iniciativas desenvolvidas com o objectivo de tentar solucionar este problema, seja através de sessões públicas de esclarecimento (com taxas de adesão, no mínimo, sofríveis, e quase sempre por parte da chamada “massa crítica”) ou, mais recentemente, de programas temáticos emitidos nos meios de comunicação social.

O que tem, então, falhado? Será a linguagem utilizada? Se sim, qual a alternativa? As responsabilidades devem ser apontadas às instituições, uma vez que estas é que têm a obrigação de demonstrar aos cidadãos de que forma é que a UE se reflecte no seu dia-a-dia. E, no fundo – em época de incertezas várias –, é isto que acaba por interessar: a vida quotidiana, nas suas dimensões social e económica.



Nesse sentido, reveste-se de particular interesse a recente análise, no Parlamento Europeu, do Livro Branco sobre uma Política de Comunicação Europeia. Nesta sessão, o eurodeputado espanhol Luis Herrero-Tejedor propôs à CE a criação de uma «esfera pública europeia», estruturada primordialmente através dos media nacionais, locais e regionais, através de uma «cobertura suficiente» das questões comunitárias.

Se, por um lado, é encorajador o facto de as instituições estarem a reflectir sobre o problema e a propor soluções concretas, há um ponto do discurso de Herrero-Tejedor que poderá ser contraproducente, se mal interpretado: «A ideia de transformar os cidadãos em motores da participação e do diálogo não parece razoável, pois não cabe aos cidadãos procurar a informação, é preciso sim que a informação procure os cidadãos».

A questão é que, apesar da já referida responsabilização – que não é senão positiva –, este enfoque na comunicação unidireccionada poderá contribuir para o reforçar da ideia de afastamento entre os cidadãos e os seus representantes.

O objectivo não é, afinal, fazer com que os europeus se sintam envolvidos num projecto que – pelos avanços civilizacionais que implica – vale a pena aprofundar? O reforço dos sentimentos eurocépticos e de defesa da “normalidade histórica” nos dias que correm deveria dar que pensar.

Nuno Loureiro
Fotos: D.R.


(artigo originalmente publicado no jornal “O Poiarense”, edição n.º 232, Abril de 2007)


Sem comentários: